Sinopse:
Ao escrever os seus singulares romances o marquês de Sade ignorava, como é evidente, as leituras que o século XX iria fazer deles. Ignorava que o seu nome daria origem a um substantivo, a um adjectivo, a uma importante forma da patologia sexual. Talvez só acreditasse em si próprio como ficcionista e teórico de imaginações que o assaltavam, exacerbadas pela solidão do cárcere. Em 1785 começou a escrever a sua primeira obra extensa, um compêndio de todas as perversões que sabia imaginar, e expunha-as sob corpo de doutrina. Iria chamar-lhe «Os 120 Dias de Sodoma ou a Escola da Libertinagem», obra secreta num rolo de papel com 12,10 metros de comprimento, escrito de ambos os lados, todos os dias escondido sob o forro da parede da cela; só mais tarde encontrado por Arnoux de Saint-Maximine e publicado por um editor de Berlim. (...) Mas escrito quase ao mesmo tempo há outro romance enorme e excessivo, com cenas ousadas apenas sugeridas por uma linguagem contida. O autor chamou-lhe «Aline et Valcour ou le Roman Philosophique», e começou a ser escrito «fruto de vários anos de insónia». A sua linguagem é «decente» e o seu tom moralizador; romance em cartas de uma longa história. Duas cartas contam a história de Léonore e Sainville. (...) A parte deste romance passada entre portugueses fala de uma Léonore que se afasta da sexualidade para voltar pura para os braços de Sainville; mas talvez se reconheça ambiguidade à sua recusa; talvez se não veja nela pudor nem sentimento mas sobretudo orgulho; talvez já se pressinta um anúncio tímido dos futuros excessos de Juliette, uma das heroínas mais obscenas de Sade, sem chegar, contudo, a pô-los aqui em prática. (Aníbal Fernandes, excertos da apresentação).Os leitores têm a oportunidade de escolher entre duas capas para a mesma obra, com reprodução de dois pormenores (que juntos completam o quadro) da pintura Terreiro do Paço no século XVII, de Dirk Stoop, 1662, óleo sobre tela, pertencente ao espólio do Museu da Cidade (C.M.L.)